Surpresas da Globalização. Por Cida Damasco

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Uruguay's forward Edinson Cavani (2ndL) leaves the pitch comforted by Portugal's forward Cristiano Ronaldo during the Russia 2018 World Cup round of 16 football match between Uruguay and Portugal at the Fisht Stadium in Sochi on June 30, 2018. / AFP PHOTO / Jonathan NACKSTRAND / RESTRICTED TO EDITORIAL USE - NO MOBILE PUSH ALERTS/DOWNLOADS

Era só uma frase de efeito ou uma piada, daquelas que costumam circular nas redes sociais. Nesta Copa, até jogo ruim é bom. No fundo, porém, a avaliação faz sentido, por tudo que aconteceu na primeira fase da disputa. Quem imaginava que a Alemanha seria eliminada tão cedo (e com o empurrão da Coreia do Sul!), que a cabeça de chave Polônia ficaria fora e a Nigéria ameaçaria a Argentina?

Nos botecos, as justificativas para essas “surpresas” vão desde a chamada “maldição das campeãs”, que condena a equipe vitoriosa a cair na primeira fase da Copa seguinte à do título, até a vingança do Brasil contra os 7 a 1 de 2014. Mas as explicações são mais racionais. A globalização do futebol está mudando o equilíbrio de forças entre as seleções que disputam as Copas. Com mais dinheiro e mais organização – e, vamos combinar, sem a necessária transparência nos negócios -, os grandes clubes europeus importam cada vez mais jogadores dos países onde há fartura de talentos individuais.

O Brasil é um dos integrantes dessa lista de fornecedores de mão de obra – assim como, na economia, é um dos grandes fornecedores de commodities. E, no final das contas, esse intercâmbio acaba “contaminando” as seleções dos países. Mesmo as que não têm tradição nesse esporte e, até pouco tempo atrás, vinham praticando um futebol ingênuo, sem condições de encarar – e incomodar – as grandes seleções, como vem acontecendo agora.

Vamos a um levantamento da composição de algumas equipes. O México, por exemplo, que amanhã enfrenta o Brasil pelas oitavas, tem 11 jogadores nos times europeus. O Japão, que se classificou por ter o menor número de cartões, conta com 14 jogadores na Europa. E o Egito mantém sete representantes de times da Inglaterra, inclusive Salah, do Liverpool, sensação da última temporada.

No Brasil, a seleção também é apenas uma mostra dessa internacionalização do futebol – em que os grandes clubes, tratam de vender o passe de qualquer garoto que desponte nos campinhos e escolinhas e só repatriam jogadores em fim de carreira ou que não deram certo lá fora. Para os torcedores mais velhos, causa até um certo estranhamento não poder provocar os rivais, no dia da convocação: “Nós temos tantos jogadores na seleção, vocês não têm nenhum.” Ainda se ouviram alguns gritos de “vai, Corinthians” quando Paulinho desencantou e fez aquele gol arte contra a Sérvia. Mas essas manifestações são cada vez mais isoladas.

Quando se vê pela rua crianças com camisas do Barcelona e do Real Madrid e cultuando ídolos estrangeiros, fica claríssimo que o futebol mudou. Cabe a quem define políticas públicas lidar com essa realidade, combatendo as maracutaias dos clubes e de algumas organizações sociais de fachada, para evitar a exploração dos jovens jogadores, e buscando melhorar as condições para quem quer exercer o esporte no seu próprio país.

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